11 Novembro 2013
Publicada por Um Dia à Vez
Fitei atentamente aquela face outrora imberbe.
“Pierre?”, pensei. Não tive dúvidas de que aquele indigente era um antigo
colega e grande amigo meu com quem travei conhecimento durante um semestre de
faculdade que fiz em Paris, na Sorbonne… Partilhara o apartamento com Pierre por
sermos ambos do curso de História, tendo esses quatro meses sido de
convalescença para mim devido ao falecimento do Tio César, marido da tia Elvira.
Reencontrar aquele amigo na situação mais ignóbil da minha vida era, por um
lado, o recuperar de memórias revitalizantes e, por outro, o sentir irracional
de uma segurança injustificada por poder ter um apoio que já anteriormente se
mostrara caloroso. Contudo, aquilo que me bombardeava a mente no momento era o
desejo de saber a razão de ele se ostentar como um sem-abrigo em plenos
subúrbios portugueses.
Depois de o reconhecimento ser mútuo, Pierre,
certificando-se de que os seus companheiros não ouviam, tratou de explicar que
aquilo era só dissimulação. Na verdade, viera recentemente para Portugal para
tirar um doutoramento em Sociologia (a investigação que escolhera fora a
dinâmica das classes marginalizadas da sociedade), pelo que, sendo acérrimo
apologista do trabalho de campo no sentido mais literal, cultivava aquele
espectáculo desde há duas semanas.
Embasbacado com aquele figurino que ele
representava, esquecera-me completamente dos recentes eventos que haviam
preenchido os últimos dois dias da minha vida, e ele, que queria já ter entrado
em contacto comigo, disse para irmos até ao apartamento dele situado nas
redondezas e, assim, devido à consternação que reconhecera na minha face, poder
compreender em que termos andava uma amizade que outrora roçara os limites do
libidinoso.
Aceitei a proposta - ou imposição - procurando
apoderar-me da segurança que agora se revelava inconstante na minha vida.
- Vamos, então?- indagou Pierre.
- Tão céleres quanto o possível… - titubeei.
Diogo de Moura
Chaves - Vila Real
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