3 Dezembro 2013
Publicada por Um Dia à Vez
Hoje acabou por ser um dia
bastante banal, tendo obviamente em conta o turbilhão de emoções que tenho
vivido nos últimos tempos.
Uma dos momentos com alguma
relevância que posso apontar aqui foi o breve diálogo que tive com João, o
recluso que mora na cela em frente da minha. Foi na altura do almoço. Eu
costumo comer na ponta de uma mesa, fazendo os possíveis por não me misturar com
ninguém. Espero sinceramente não ficar muito tempo na prisão, portanto o meu
objectivo é passar estes dias totalmente invisível.
Porém, quando comia, senti um
vulto a sentar-se mesmo à minha frente. Quando levantei a cabeça vi que era o
João, que ostentava um olhar levemente esgazeado.
- É amanhã – disse, simplesmente.
Engoli em seco mas não respondi
logo. Fiz-me desentendido. Encolhi os ombros e continuei a comer. João parecia
um sujeito demasiado estranho para ser levado a sério.
- Lembras-te do que te disse
certo? – continuou ele. – Eles surgem de três em três dias!
Um ligeiro arrepio percorreu-me a
espinha de alto a baixo.
- Foi imaginação minha – respondi
monocordicamente. – Teve de ser. Ela está morta.
João riu-se tal como eu poderia
esperar que um lunático e risse. Depois continuou a comer a sua refeição em
silêncio, ignorando a minha pessoa durante o resto do tempo de almoço. Foi
apenas quando acabou e se ergueu da sua cadeira que voltou a falar:
- Eu devia conseguir trocar a
minha vida pela tua… para veres o que eu vejo.
Foi num total silêncio que eu vi
João a afastar-se, com as suas palavras a fazerem ainda ricochete na minha
mente, ecoando como uma tempestade amaldiçoada por algo inexplicável.
Será que ele quis dizer o que
disse? Será que foi uma frase lançada por alguém que tem “um parafuso a menos”?
Ou será que o sentido das suas palavras tem o significado arrepiante que poderá
ter?
Tudo o que sei, é que pela
primeira vez desde há muito tempo tenho um medo genuíno do que dia que aí vem.
Meu Deus, será que ela vem visitar-me novamente?
Rui Machado
Leiria
0 comentários: